Ao longo das últimas décadas, a construção de marcas tornou-se uma obsessão no universo do marketing. Termos como “Branding” e “Posicionamento” se popularizaram tanto que, muitas vezes, são usados de maneira equivocada ou, pior, como sinônimos. Mas e se a confusão entre esses conceitos não for apenas uma questão semântica? E se ela estiver impedindo as empresas de alcançarem o verdadeiro crescimento estratégico?
Minha opinião é direta: o Posicionamento vem antes do Branding. Enquanto o Branding se preocupa em criar uma marca forte, o Posicionamento foca em como a empresa se insere no mercado, em relação aos concorrentes, para impulsionar seu crescimento.
Sem um Posicionamento sólido, o Branding pode se tornar um investimento ineficaz, como construir um ótimo prédio em um bairro ruim. Vamos explorar por que o Posicionamento deve ser o ponto de partida de toda estratégia de marca e como essa compreensão pode transformar a dinâmica dos negócios.
Esclarecendo a confusão sobre o Posicionamento
A confusão em torno do termo “Posicionamento” tem raízes históricas. O posicionamento surgiu como uma ferramenta publicitária nos anos 1940 e 1950 para identificar e alavancar o que tornava uma empresa única. Talvez, ela tenha começado Rosser Reeves, que defendia a ideia de criar uma “Proposta Única de Venda” (“Unique Selling Proposition”). Nesse contexto, posicionar-se significava encontrar um único atributo ou benefício que diferencia o produto na mente do consumidor.
Nos anos 1970, Al Ries e Jack Trout ampliaram o conceito com o livro “Positioning: The Battle for Your Mind”, afirmando que o Posicionamento dizia respeito a ocupar uma “posição” na mente do consumidor em relação à concorrência. Veja, que o ponto central aqui é a análise da concorrência. Contudo, nesse momento o posicionamento era ainda uma abordagem comunicacional, centrada em percepções.
Na mesma época, o campo da estratégia empresarial consolidava conceitos fundamentais. Em 1980, Michael Porter trouxe contribuições cruciais ao destacar a importância de escolher uma posição estratégica no mercado onde a empresa pudesse estabelecer uma vantagem competitiva sustentável. Suas ideias ampliaram a visão do mercado, transformando o Posicionamento em um elemento essencial para a gestão empresarial1, indo além das campanhas publicitárias.
Essa evolução gerou, no entanto, algumas confusões. Muitas empresas ainda veem o Posicionamento como algo exclusivo do marketing, ou o confundem com Branding ou com a mensagem da marca. Embora não seja tecnicamente errado, esse entendimento está desatualizado. Essas funções são distintas, embora interdependentes.
Ano/Década | Autor | Conceito | Explicação |
1940-1950 | Rosser Reeves | Unique Selling Proposition | Todo produto ou serviço deve ter um diferencial em relação aos concorrentes, e isto deve ser o foco do anúncio. |
1950-1960 | David Ogilvy | Personalidade da Marca | Para ele, todo anúncio é parte do investimento de longo prazo na personalidade da marca. “O que um produto faz e para quem se destina.” |
1970s | Al Ries & Jack Trout | Posicionamento | O posicionamento deve partir de algo que já está construído na mente do consumidor. |
1980s | Michael Porter | Estratégia Competitiva | A empresa deve escolher uma posição de mercado que crie uma vantagem competitiva. |
Branding ou Posicionamento?
Para esclarecer a distinção, é importante vermos um pouco do significado dos conceitos.
Branding: De acordo com David Aaker, uma das maiores referências em gestão de marcas, o Branding é o processo de criar e gerenciar associações positivas para uma marca. Kevin Keller, outro expoente, complementa que o Branding busca construir “capital de marca” (“brand equity”) ao gerar diferenciação, relevância e conexão emocional com o consumidor.
Em termos práticos, o Branding se preocupa em construir uma marca forte. O Branding busca responder a pergunta “O que eu faço, para tornar esta marca mais forte perante o público?”
Posicionamento Competitivo2: Por outro lado, o Posicionamento competitivo é a definição de qual posição de mercado uma empresa quer ocupar. O posicionamento busca responder à pergunta: “Em que mercado vamos competir e como?”. Ele envolve decisões sobre segmentos de mercado, proposta de valor, estratégias de preço e modelo de negócio.
Casas Bahia: um exemplo prático
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Um Posicionamento estratégico bem definido é a base para um Branding eficaz. Isso ocorre porque o Branding, para ser bem-sucedido em fortalecer a marca, precisa de uma direção clara. Sem um Posicionamento sólido, o Branding pode se tornar incoerente ou até irrelevante.
O exemplo da Casas Bahia ilustra bem isso. A empresa passou por um primeiro rebranding na tentativa de se modernizar e competir no mercado online. No entanto, o posicionamento adotado para esse novo cenário não era sustentável. Ao tentar competir com outros marketplaces online, a marca não tinha uma vantagem competitiva clara, o que gerou prejuízos financeiros significativos.
Antes dessa mudança, a Casas Bahia tinha um posicionamento de mercado claro e forte: o parcelamento de eletrodomésticos e acessibilidade de atendimento. Esse modelo de negócios, aliás, é altamente desejado em outros países, como foi caso da BrightHouse no Reino Unido, que oferecia um serviço semelhante.
Nos último ano, a Casas Bahia voltou a resgatar sua posição original, trazendo de volta elementos do seu branding anterior. E vale notar que, em ambos os momentos, o branding seguiu uma direção coerente com a posição de mercado definida pela empresa.
É um exemplo claro de que Branding bem feito, sem um posicionamento correto, não funciona.
Conclusão
O Posicionamento vem antes do Branding, e isso não é uma questão de ordem cronológica, mas de lógica. O Branding só pode cumprir sua função de criar uma marca forte se estiver ancorado em um Posicionamento sólido, que define o caminho a ser trilhado. Empresas que ignoram essa dinâmica correm o risco de construir marcas desconectadas de sua realidade competitiva, desperdiçando recursos e oportunidades.
Portanto, a reflexão que deixo é simples: antes de investir em rebranding, pergunte-se se sua posição de mercado captura a melhor oportunidade disponível para sua empresa. Responder a essas perguntas é o primeiro passo para construir uma marca não apenas forte, mas também relevante e sustentável no longo prazo.
- Kotler, por exemplo,define a diferença entre “Reposicionamento Real” e “Reposicionamento Psicológico” para distinguir as duas abordagens (mudar a apenas a comunicação e percepção ou mudar o negócio) ↩︎
- Os termos ‘Posicionamento’, ‘Posicionamento de Marca’, ‘Posicionamento de Mercado’ e ‘Posicionamento Competitivo’ frequentemente são tratados como sinônimos. Neste momento, escolhi usar ‘Posicionamento Competitivo’ para destacar a aplicação do termo relacionado a “Estratégia Competitiva”. ↩︎